quarta-feira, 16 de dezembro de 2009

Entrevista: Beto Ribeiro, autor do best seller Poder S.A.

Érica Nacarato

Em 2008, um livro baseado em fatos reais, com conversas de corredores das mais diferentes e importantes empresas no Brasil, foi um dos mais vendidos e destaque nas principais mídias. Mas não parou por aí, "Poder S.A. - Histórias Possíveis do Mundo Corporativo", escrito por Beto Ribeiro, ganhou tanto destaque que se transformará em série de TV no ano que vem.

Em entrevista ao Carreira & Sucesso, o jornalista contou como foi sua passagem de produtor e diretor de vídeos e programas de TV para o mundo corporativo, e as experiências que tirou desses anos vividos em grandes organizações brasileiras, que resultaram no seu livro.

Boa leitura!

Você é formado em jornalismo e trabalhou, no início da sua carreira, com produção, textos e direção de vídeos e programas de TV. Como foi a sua entrada para o mundo corporativo?

Eu trabalhava em uma produtora quando a Americanas, em 1996, me chamou para participar da abertura de uma área deles, de internet, que estava começando a aparecer no Brasil. Se falava muito pouco disso, e a empresa queria fazer o seu primeiro site para atender alguns clientes. O Germán Quiroga foi o profissional chamado para ser o diretor de tecnologia da Americanas.com, e como já tínhamos trabalhado juntos há um tempo atrás, ele me convidou para ser o gerente de conteúdo, e depois o gerente de marketing. Quando me demiti da Americanas.com, fui chamado para trabalhar na Cyrela, onde saí recentemente. No total, foram 10 anos em empresa.

Como foi essa experiência no mundo corporativo?

A experiência resultou no livro. Como eu fui convidado a participar do mundo corporativo, e não era uma coisa que eu almejava ou tinha a intenção, e nem sabia direito o que era, sempre tive uma visão diferente das pessoas que estavam lá dentro. Eu não tinha o deslumbre de estar em uma empresa, a vontade de morrer nela e aquele sonho de aposentadoria pela mesma organização. Então, eu conseguia ver tudo de uma forma mais crítica. Eu aprendi muito no mundo corporativo, ganhei dinheiro com ele, não renego tudo isso, mas eu não fazia parte real daquilo. Eu não tinha nenhuma expectativa sobre esse universo, e quando você não tem nenhuma expectativa sobre algo, você começa a ver a coisa da maneira que ela realmente é, nem menosprezando e nem se deslumbrando, simplesmente você olha e gosta ou não. O tempo que eu fiquei nesse mundo, eu gostava, não tinha problema nenhum, mas eu sabia que não era daquela turma, que um dia acabaria saindo de lá e esse dia acabou chegando, talvez até mais rápido do que eu imaginava. Eu já estava preparado para isso, o livro já estava pronto, e eu encerrei com chave de ouro. Saí de todas as empresas onde trabalhei só com amigos. Eu pedi demissão, ninguém me mandou embora, e geralmente eu saía sendo um dos executivos, dentro dos planos das empresas, com a maior possibilidade de crescimento. Em uma delas, eu ia ser convidado para ser diretor de marketing no mesmo dia em que pedi demissão. Não tenho nenhuma mágoa com empresa alguma ou com o mundo corporativo em si, só não era minha turma mesmo.

O livro, então, foi o motivo para você sair?

Na verdade, eu tinha um plano financeiro e já sabia a data que poderia sair. Eu já estava aplicando na bolsa desde 1999, já tinha um desejo e sabia mais ou menos por onde andar, porque você precisa ter um colchão de segurança para poder fazer as suas coisas. A ideia era eu parar e escrever o livro, mas ele acabou nascendo quando eu ainda estava no mundo corporativo; no meu último ano em empresa, acabei escrevendo o Poder S.A. muito rápido e com muita facilidade. Então quando saí do mundo empresarial, ele já estava pronto, já estava com editora e data de lançamento. Eu antecipei, era para lançar agora e acabei lançando no ano passado.

Como surgiu a idéia de escrever o livro Poder S.A.?

As histórias que estão no livro não são minhas; já que não deixo brecha para me assediarem, paro a pessoa antes de qualquer tentativa. Eu conto as histórias que vi acontecendo com outras pessoas, e histórias que eu ficava realmente chocado de saber que a pessoa não tomava nenhuma providância para mudar aquilo, que ela era co-autora da sua própria desgraça. O livro não é um drama, porque o meu texto é um humor negro, eu consigo ver dentro daquela tragédia toda um viés divertido, e mostro, dentro do texto, que a pessoa é co-autora de tudo o que está acontecendo com ela, que ela aceita. Por isso que acho que o livro acaba sendo mais divertido e lúdico.

As pessoas ao seu redor sabiam que você estava escrevendo o livro?

Não, ninguém soube. Quando eu pedi demissão foi uma surpresa para todo mundo, inclusiva para o meu chefe, e quando contei que ia lançar um livro, as pessoas também ficaram surpresas, e ficaram mais surpresas ainda, quando leram e descobriram sobre o que é o livro. Muita gente começou a achar que eu estava saindo porque, como tenho uma boa desenvoltura, sempre apresentei as campanhas e tenho facilidade em conversar, ia virar palestrante do mundo corporativo. Olha que absurdo! Elas acharam que meu livro era uma autoajuda corporativa, e perceberam que de autoajuda não tem nada. Foi uma surpresa. Claro que as pessoas mais próximas sabiam que eu gostava de escrever e que era meu real desejo, já que criava as campanhas e escrevia muita coisa. Então, para essas pessoas, não foi surpresa eu virar escritor, mas de repente foi surpresa eu ter coragem de contar histórias que eram baseadas em fatos reais. Quando começaram a ver na imprensa sobre o que era o meu livro, as pessoas ficaram aterrorizadas, achando que eu ia falar de coisas pesadas. E como não sabiam como eu estava contando e o que estava contando, existia uma preocupação. Mas acho que quem está no livro não se percebeu lá, e quem está e se percebeu, se divertiu. Eu só tive respostas legais. Eu não ataquei ninguém, não teve humilhação, e escrevi histórias divertidas, onde camuflo muita coisa para entrar no jogo do esconde-esconde, quem é quem, o que é o que, qual empresa é qual. Tem gente, por exemplo, que acha que uma empresa X é outra. Acho isso muito divertido, porque às vezes nem sabia que essa empresa tinha qualquer problema, o que mostra que apesar de serem histórias particulares, elas existem igualmente em qualquer organização, porque faz parte do mundo empresarial. Existia um pouco da surpresa, da preocupação, mas acredito que as pessoas se divertiram mais do que ficaram preocupadas.

As histórias que você coletou foram das empresas que você passou?

Isso eu não conto, mas apesar de ter trabalhado só em três ou quatro empresas, eu conheço muitas organizações, porque no mercado corporativo você acaba tendo muitas reuniões entre empresas, faz parcerias entre marcas. Então, quais são eu não revelo.

Você imaginou que o livro seria esse sucesso de vendas?

Sucesso eu sempre desejei que fosse, como bom marqueteiro que já fui, eu não lanço um produto sem pensar no mercado dele, mas eu me surpreendo ainda com algumas coisas, como o livro ter virado matéria tão rápido. Ele tem um ano de vida e muita coisa publicada. Quando eu recebi o convite da Gabi (Marília Gabriela, apresentadora do canal GNT), foi uma surpresa, quando você vê o livro como um dos mais vendidos e surgem três propostas de três canais de TV diferentes para fazer do livro uma série, é muito surpreendente. Eu até fui para Cannes, no festival de TV, através de um convite do canal que comprou o meu livro, mas que eu ainda não posso revelar. Tem muita coisa que está acontecendo que eu ainda me surpreendo positivamente. Quando começarem a falar do livro como uma série de TV, as pessoas vão se surpreender ainda mais, porque vão descobrir qual é o canal, o que vai acontecer, como vai acontecer, quais são os atores que já estão envolvidos. Me convidaram para escrever o roteiro... Então tem muita coisa acontecendo na minha vida, e por causa do livro, o que é muito rápido.

Já tem uma previsão de quando vai estrear?

Deve estrear em 2011, porque grava no ano que vem. Mas em 2010, já vai começar a se falar muito das gravações, vai ser gravado em São Paulo e dará uma mobilizada na cidade, pois será uma São Paulo bem legal e poderosa, como Nova Iorque, e terá um “Q” de auto-estima para a cidade.

Teve alguma história que te deu um clique e você percebeu que seria legal escrever esse livro?

Teve uma primeira que é a da copeira, que foi a primeira que escrevi. Quando soube dela, fiquei muito chocado. Ali nenhum personagem se salva, ninguém é tão bonzinho assim, nenhuma vítima ou vitimizador. Essa foi a primeira que eu consegui, e aí comecei a escrever uma história em cima da outra, e vi que elas poderiam ser interligadas, mas não necessariamente com os mesmo personagens - o que me daria uma liberdade maior para contar os tipos e caricaturas desse universo. Eu tinha 14 histórias, daí olhei um prédio, já que é uma história em cima da outra, e prédio tem uma força, principalmente no universo dessas grandes empresas, em que o endereço fala muito sobre ela, e se torna, muitas vezes, muito mais importante do que o trabalho que a própria empresa faz dentro daquelas paredes de mármore importado.

Você está fazendo uma continuação do livro. Como ela será?

Sim, estou escrevendo e devo lançar entre agosto e setembro do ano que vem, vai depender do começo das gravações da série. Quero fazer uma coisa colada à outra. Sobre como ele será, é uma surpresa. Eu estava com muito problema sobre como continuar o livro para não parecer algo chato, e veio uma ideia boa, que acho que vai agradar quem já leu, e quem ainda não leu, vai querer ler o primeiro.

Após esse período atuando em empresas, que lição você tirou?

Eu acho que ajudei muito as pessoas desse mundo corporativo a perceberem que você é o dono da sua vida. Não tem nada que justifique você ser infeliz. Você tem que gostar do jogo, se gostar, não tem o mínimo problema, mas se estiver lá só porque foi a única coisa que restou, é melhor perceber o que quer fazer e correr atrás. A infelicidade dentro do seu trabalho é sua, a empresa não tem culpa. E é isso que eu repito muito para as pessoas: “não está feliz? Vá embora”. Elas acham muito simplista, e é simples assim. Eu fiz isso, mas de forma muito bem planejada. Uma coisa importante é que eu era extremamente bem tratado dentro de todas as empresas onde trabalhei, se eu quisesse poderia ter feito carreira em todas elas, e poderia chegar à presidência. Gostavam de mim, me respeitavam muito, e eu tinha nisso tudo, um conforto muito grande, era para eu ficar, tranquilamente, nessas empresas. Eu nunca tive nada negado, tinha um excelente salário, um excelente bônus, um cargo muito invejado e bem trabalhado, e resultados muito bons, assim como novas ideias. Como diria um dos termos corporativos, eu agregava valor à marca da empresa. E eu ter essa visão crítica dentro do mundo corporativo é que foi muito chocante, pois, muitas vezes, eu era o “golden boy”; e se eu que tinha todo esse conforto pude olhar e decidir que não era isso que queria e fui embora, por que as outras pessoas que não estão confortáveis e estão infelizes, não podem ir? Essa infelicidade deveria ser o maior argumento para a pessoa sair.

Talvez não seja esse seu jeito que fez você ter sucesso no mundo corporativo?

Pode ser, isso faz parte. Eu tenho uma maneira às vezes mais simpática ou até mais arrogante, como pensam algumas pessoas, mas tudo isso compõe e faz minha equação de ter chegado aonde eu cheguei e fazer o que eu fiz. O que não significa que, se a pessoa não tiver esse jeito, ela não consiga. Porque aí é a gente fazer casta demais nas pessoas, e cada um tem o seu jeito. O medíocre pode chegar lá em cima? Pode, se ele tiver boas relações, pode; assim como a pessoa que é extremamente talentosa, mas é quieta, pode não chegar lá em cima por causa desse jeito dela. Mas também, ela pode se entender melhor e mudar ou ir buscar uma empresa que valorize esse lado. Há tantas possibilidades na vida, acho que se fechar em uma só é bobagem.

Como está sendo para você voltar ao jornalismo, fazer roteiro e escrever?

É uma felicidade. Eu estava muito próximo de me aposentar em algumas coisas. Tinha a ideia de ficar muitos anos sem fazer nada, só viajando, pesquisando. E tudo aconteceu naturalmente, e em algo que eu gosto muito... Gosto de televisão, tenho prazer em fazer TV, gosto de teatro, cinema... Está tudo se abrindo para mim, e me chamando por causa do meu texto. Isso é ótimo. No jornalismo em si, não consegui voltar, mesmo porque não tenho tempo de escrever uma matéria. Agora, tem atores que estão me pedindo para fazer peças de teatro para eles, e eu quero fazer. Tem, também, esses programas todos de TV, estou escrevendo agora o roteiro do “Operação de Risco”, da Rede TV, que é um reality policial, que não tem nada a ver com mundo corporativo, e depois devo lançar um livro dessa série. Então tem muita coisa acontecendo, e eu sou um só, tenho que me preocupar apenas em não me estressar, mas é muito prazeroso. Quando você faz algo que gosta, por mais cansativo que seja, o prazer é tão confortante que não há problema.

Fonte: Jornal Carreira e Sucesso

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