O plenário do Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) é considerado pelos maiores advogados comerciais do País como o melhor ponto de encontro de Brasília. Às quartas-feiras, dia de sessão, ele costuma ficar abarrotado de engravatados que buscam as últimas informações sobre os casos mais ferventes do meio empresarial. Quem não está lá, dizem eles, acaba perdendo. Essa rotina ganhou fôlego nos últimos 15 anos, quando o número de processos de fusões e aquisições apresentou um crescimento impressionante de 3.000%, segundo levantamento feito pelo iG.
O aumento não é obra apenas do amadurecimento da economia brasileira. Na comparação entre os governos Fernando Henrique Cardoso e Luiz Inácio Lula da Silva, o Cade vem sendo acionado cada vez com mais frequência. Até 2002, o Cade havia julgado 2.077 atos de concentração entre empresas. Desde o início da era Lula, no entanto, o tribunal despachou 4.922 processos, diferença de quase 140%.
"O governo entrou para valer nesses negócios", afirma o advogado Ruy Coutinho, ex-presidente do Cade. "O BNDESPar nunca financiou tanto o processo de concentração como agora".
A diretriz para esse comportamento vem desde a gestão do economista Carlos Lessa à frente do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES). Lessa sempre foi um fervoroso defensor de grandes grupos nacionais que pudessem competir de igual para igual com empresas internacionais. Chegou a aventar a ideia de juntar a Companhia Siderúrgica Nacional e a Usiminas, no que ficou conhecido como a reedição da extinta Siderbras.
Com o atual presidente Luciano Coutinho, a política não foi alterada. Nos bastidores, ele costura uma associação entre os três maiores laboratórios de genéricos do País para fazer frente aos concorrentes estrangeiros via um programa específico do banco, o Profarma. O projeto de Coutinho tem até um nome – jocoso, mas que mostra a intenção do governo: Farmobrás.
“Essa visão de criação de winners eleitos pelo Estado é perigosa”, discorda João Grandino Rodas, também ex-Cade e atual reitor da Universidade de São Paulo. “É importante ter empresas fortes, mas nem tão fortes assim que possam ameaçar a concorrência”.
Processos atrasados
Para o Cade, a situação é ainda mais complicada. Sempre sujeito à falta de investimentos do governo, o tribunal sofria até há pouco tempo com a demora do Palácio do Planalto na definição de nomes para ocupar os cargos de conselheiros. Mais recentemente, com a saída do decano Paulo Furquim, uma nova vaga se abriu e ainda não há qualquer previsão para que ela seja preenchida.
“Esse tipo de atraso atrapalha o bom andamento das nossas atividades”, avalia o atual presidente do Cade, Arthur Badin. “Conseguimos diminuir pela metade a média de dias que levamos para analisar um processo, mas à custa de um trabalho dobrado”.
Foi essa, inclusive, a principal razão exposta por Furquim para abandonar o tribunal faltando seis meses para o término de seu mandato. Para complicar, ele era o relator da compra da Brasil Telecom pela Oi, da aquisição da Sadia pela Perdigão, da compra do Unibanco pelo Itaú, da aquisição do Ponto Frio pelo Pão de Açúcar. De telefonia ao grande varejo, passando pelo setor bancário e por diversos setores de alimentos, o decano foi sorteado como relator dos processos mais importantes em tramitação no Cade. “São casos relevantes, mas que só terão decisão em 2010", justifica Furquim. "Portanto, será melhor para o encaminhamento que seja um novo conselheiro”
Mas apesar de grandes negócios chamarem mais atenção, o grosso dos casos envolve empresas que não estão sob os holofotes. E são elas as que mais influenciam na vida do consumidor. Hoje, quase 60% do setor de produtos químicos estão concentrados nas mãos de 15 grupos.
Pesquisa feita no início de 2009 pela consultoria Latin Link apontava que os setores mais atuantes nos processos de concentração comercial seriam etanol, frigoríficos, ensino superior e saúde privada. A comprovação veio ao longo do ano (a Cosan comprou a NovAmérica e a Benálcool, entre outras; o frigorífico JBS-Friboi acertou o controle do Bertin; a Amil se juntou à Medial e o Itaú-Unibanco fundiu sua área de seguros com a Porto Seguro).
Ainda seguindo essa análise, até 2015, 70% do setor sucroalcooleiro será dominado por apenas sete empresas. No mercado de educação superior, também 70% estarão nas mãos de 20 grandes grupos econômicos.
Fonte: Ultimo Segundo
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