sábado, 4 de setembro de 2010

Baratos da Ribeiro lança portal dedicado ao vinil e se firma como um dos centros da cultura alternativa no Rio

Carlos Albuquerque

RIO - Para Maurício Gouveia, dono do sebo Baratos da Ribeiro, a vida dá voltas como um disco antigo rodando na vitrola. Nascido há quase dez anos, após um projeto frustrado na internet, o sebo volta ao universo on-line e lança nos próximos dias o portal Prefiro Vinil (prefirovinil.com.br) , dedicado, segundo ele, à "comercialização de tudo o que gire em 33, 45 ou 78 rotações". Para promover a iniciativa, feita em parceria com lojistas de todo o país, o Baratos se une a dez festas, que acontecem pela cidade nos próximos dez dias, nas quais o bolachão preto com um buraco no meio ainda é a estrela. Além disso, sábado, dentro do próprio sebo, faz a Sambaratos, edição especial, dedicada ao samba, do evento Clube do Vinil (que ocorre ali há quatro anos).

Por trás de tudo isso está esse agitado paulista de Taubaté, um incontrolável contador de histórias, com seu sotaque ainda marcante, que migrou para o Rio há 13 anos. Apesar de atender como DJ Ácaro quando está à frente dos toca-discos, ele não deixa a poeira baixar na lojinha de Copacabana, transformando-a num dos mais ativos centros da cultura alternativa do Rio, entre eventos de música (já passaram por ali mais de 150 bandas novas) e literatura (como o Clube da Leitura, que reúne, desde 2007, roteiristas, escritores e, claro, devoradores de livros).

- Espero que o PrefiroVinil ajude a transformar o mercado de LPs no Brasil - conta ele, enquanto fuma um cigarro e depois outro, perto de uma estante onde repousam discos importados de rock dos anos 70 (Gregg Allman, Humble Pie etc.). - Uma das ideias é criar um catálogo de bandas novas, voltadas para o público jovem e que frequenta clubes e festivais. Não dá pra ficarmos só com os coroas compradores de reedições caras de LPs clássicos dos anos 70. Já temos um formato de parceria que queremos oferecer à Polysom e à Trama, para viabilizar o lançamento em vinil de bandas como Mombojó ou Móveis Coloniais de Acaju.

São 21h, a loja está fechada, e os discos de jazz, rock, MPB, soul e reggae estão, enfim, sós. Até uma hora antes, a Baratos estava em ebulição, interditada, servindo de cenário para as gravações da minissérie da TV Globo "Afinal, o que querem as mulheres", dirigida por Luiz Fernando Carvalho, com roteiro de João Paulo Cuenca. Da porta, o público tentava ver astros como Rodrigo Santoro, Vera Fischer, Osmar Prado e Michel Melamed em ação:

- Teve uma senhora que conseguiu entrar na loja durante as gravações e foi ficando, mexendo nos discos e livros, até que eu descobri que ela não fazia parte da equipe. Só estava ali para ver os artistas. Tive que pedir, gentilmente, que ela se retirasse.

Quando surgiu, em meados de 2001, o Baratos era apenas uma espécie de suporte físico para uma tentativa de vendas de livros on-line que não vingou.

- No esforço de financiar o lance na web, o grupo criou três livrarias, e fui posto no comando do Baratos da Ribeiro. Quando aquilo se desfez, eu e meu sócio, Paulo Terra, ficamos com o sebo, que foi se tornando um lugar cada vez mais rock'n'roll. A venda de discos de vinil, por exemplo, foi decorrência natural do meu hábito de colecionar LPs.

Como uma coisa atrai a outra, os discos, além dos livros e dos quadrinhos, começaram a atrair um público fora do padrão de um sebo tradicional, coisa que o Baratos nunca foi.

- Tive a sorte, ao longo desse trabalho, de conhecer um monte de artistas, críticos, agitadores culturais e colecionadores. Os eventos no sebo partiram do contato com essa galera e da indignação com a falta de espaço para os artistas que admiramos se expressarem. O que fizemos foi abraçar boas ideias que os frequentadores nos trouxeram. Foi assim com o Vespeiro, que, no seu auge, entre 2004 e 2007, botou umas 150 bandas diferentes para tocar entre os livros, de Canastra a Cachorro Grande. E foi assim também com o Clube do Vinil e o Clube da Leitura, que hoje é organizado pelos seus próprios participantes.

Além de dirigir o sebo, Maurício é o responsável pelo seu abastecimento. Suas andanças pela cidade e pelo estado para comprar discos usados parecem saídas do livro "Alta fidelidade", de Nick Hornby:

- Já visitei mansões e casebres, já estive em escritórios no Leblon e sítios em Xerém para comprar discos usados. Já fui até outros estados atender a chamados de avaliação. Dia desses mesmo, comprei em Duque de Caxias a melhor coleção de rock clássico em que já botei os olhos. Mas é claro que rolam umas roubadas. Certa vez um senhor me atendeu de cueca. Fazendo cara de paisagem, pedi perdão por ter aparecido em hora imprópria e disse que voltava depois.

Antes de fechar a loja de vez, Maurício sobe as escadas e volta com o disco mais valioso do Baratos: um vinil de dez polegadas do grupo Velha Guarda, à venda por R$ 1.650.

- Temos a trilha do "Caçadores da arca perdida" assinada pelo Spielberg, mas o item mais caro é este aqui - diz ele, segurando com cuidado o vinil. - Ele tem autógrafos de Pixinguinha, João da Baiana e Donga.

Fonte: O Globo

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