sábado, 7 de maio de 2011

Marcas precisam ser "mais humanas", mas não sabem como

Pesquisa indica que 53% dos brasileiros não vêem nas marcas valores humanos que consideram importantes. O que está faltando?

Para humanizar marcas, empresas devem olhar para o indivíduo, e não para o consumidor

Rio de Janeiro - Sair do racional e entrar na direção emocional para ter envolvimento. É isso o que os consumidores esperam das marcas.

Pode parecer que ideias como essa não são mais tendência e sim um lugar comum na estratégia de marketing das empresas. Conceitos que falam de transparência no relacionamento entre marcas e consumitores já estão tão batidos no discurso do mercado, que podem parecer notícia velha.

Mas a verdade é que poucas companhias brasileiras entenderam a importância de observar o consumidor com novos olhos, diante de todas as mudanças que vêm sendo desenhadas nos últimos anos.

Por isso, se algo ainda não foi bem absorvido e executado por grande parte das empresas, podemos, sim, chamar de tendência. É o que diz Paulo Roberto Al Assal, diretor-geral da Voltage, empresa especializada em human insights.

Em entrevista, Assal cita o que ainda precisa ser bem executado no Brasil em termos de branding e marketing e traz o foco para as transformações no comportamento das pessoas.

Muito mais do que entender o consumidor, a Voltage busca compreender os indivíduos enquanto seres humanos. A partir deste conhecimento, a empresa contribui para projetos de novos produtos e conceitos, embalagens, comunicação e planejamento. Entre os clientes da agência estão macas como Unilever, Nivea, Leroy Merlin, Carrefour e Philips.

As transformações na era da informação

O acesso a muitas informações fez do consumidor mais exigente e deu a ele um poder que não é apenas um discurso, mas algo real.

As empresas precisam entender a importância do investimento em branding para humanizar as marcas e torná-las autênticas.


Casos recentes como o da Brastemp mostram que as companhias reconhecem as mudanças no mercado e no comportamento do consumidor, mas ainda não sabem agir de acordo com elas.

“Falamos de internet, mas não sabemos lidar com ela. Acho que houve um barulho excessivo no caso da Brastemp, que é uma marca de ótima reputação. Antes de se desesperar, a empresa deve ver se isso realmente chegou à massa e aos influenciadores e se manchou a reputação. Hoje as pessoas realmente acham que a Brastemp é uma marca ruim por causa da reclamação de um cliente, sendo que ela tem uma reputação de anos e anos? Obviamente, se fosse outra marca com uma imagem negativa, eu não estaria falando a mesma coisa”, ressalta Assal.

As transformações na dinâmica do mercado acabam forçando as marcas a irem além do que estavam acostumadas a fazer.

De acordo com a pesquisa Brand ID, conduzida pela Voltage, em parceria com a Bridge Research, e inspirada no estudo britânico Brand Personality, do The Future Laboratory, 45% dos entrevistados esperam que as marcas sejam amigas. Já 62% acreditam que falta honestidade por parte delas e 53% dos brasileiros não vêem nas marcas valores humanos que consideram importantes.

Transparência e presença

Essa percepção é resultado do desinteresse da maioria das empresas em manter um relacionamento próximo e sincero com os consumidores.

No mercado internacional, há dois cases que mostram o que pode ser feito neste sentido. Um é o da Domino’s Pizza, que assumiu publicamente, por meio de uma campanha, que reconhecia a falta de qualidade de seu produto. Apesar de arriscada, a iniciativa era uma tentativa da empresa de mostrar-se transparente.

Também nos Estados Unidos, a marca de cereal Trix aproveitou um post de uma internauta para se aproximar e gerar boca a boca virtual.


Depois de ler o tweet da garota que dizia que “morreria porque não tinha Trix em casa”, a empresa mandou um caminhão carregado de caixas do produto para a casa da consumidora.

No Brasil, a Coca-Cola fez uma ação semelhante, quando enviou bebidas para Marcus Lemos, que reclamava do calor no trabalho e deseja a bebida.

“O caso de Trix, por exemplo, é um exagero, mas mostra que a marca está monitorando e percebendo essa relação que é pautada por outros fatores que não apenas a parte comercial. As pessoas querem marcas engajadas, que tenham um propósito, e 90% das marcas brasileiras não têm isso na essência. Mesmo no mundo são poucas as que têm um propósito definido, como a Unilever, que é vitalidade, ou a Apple, que é usabilidade”, acredita o executivo.

Neutralidade sobre as marcas

Para atender as necessidades e os desejos deste novo consumidor, as empresas precisam ir além e fazer algo pela vida das pessoas. Por isso a necessidade de humanizar as marcas, o que só é possível quando o olhar é desviado do consumidor para o indivíduo.

Muito antes de pensar em produtos, todos estão preocupados com assuntos como qualidade de vida, saúde e família.

A pesquisa Brand ID indicou que 52% dos brasileiros disseram “sou neutro em relação às marcas. Elas não ajudam nem prejudicam minhas decisões no dia a dia”.

Pode parecer simples, mas uma afirmação como essa é capaz de destruir uma estratégia de marketing que coloque no centro do planejamento um produto ou serviço, antes de focar nos anseios e desejos destes consumidores.

“O que é mais importante, a saúde do seu filho, a sua casa própria ou uma marca? As pessoas têm outras prioridades. A Caixa Econômica Federal é uma marca tão bem vista pelo brasileiro porque o maior sonho dele é a casa própria. E é ela quem fala ‘vem comigo que eu vou te dar a casa própria’. As pessoas esperam das marcas as mesmas coisas que esperam de um amigo. Não ache que a sua marca está regendo as pessoas”, diz Assal.


Geração Y e o consumo

Este cenário torna-se ainda mais complexo com o aumento do potencial de consumo da geração Y.

Ansioso por natureza, este grupo é insaciável. Por isso, mais do que pensar em um produto, as companhias devem prestar atenção nestes consumidores.

Se eles são capazes de trocar de emprego com frequência, imagina o impacto que isso tem na escolha de produtos e serviços?

“A geração Y espera autenticidade das marcas, o que não é fácil. Ou se é autêntico ou não é. Também desejam cumplicidade, mas são muito móveis. Esperam que a marca esteja com eles ao longo do dia, que os acompanhe. Este é um desafio para as empresas nunca antes visto. Mas também é uma grande oportunidade”, declara o diretor-geral da Voltage.

Ao perguntar sobre a marca mais amada, o levantamento Brand ID teve apenas uma citação: Apple.

“A maioria, no entanto, disse que não ama marca nenhuma. Que ama o pai, a mãe, e que quem ama marca é o consumista desenfreado. Já Havaianas e Osklen foram as únicas marcas destacadas pela autenticidade e pelo life style. Se apenas duas foram mencionadas e somente uma é amada, estamos com um problema”, ressalta, mostrando que as empresas que souberem preencher este vazio conquistarão algo tão – ou mais – importante quanto o market share ou o share of mind: o share of heart. Ou seja, o espaço que você conquistou no coração do consumidor.

*Com reportagem de Bruno Mello.

Fonte: Portal Exame

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