Ações implantadas previamente pelas autoridades poderiam salvar centenas de vidas
Sérgio Vieira, do R7
Na manhã seguinte à tragédia, moradores já faziam homenagens às vítimas dos deslizamentos.
Tragédias como as da região serrana poderiam ser evitadas. Essa é a opinião dos especialistas consultados pela reportagem do R7, que elaboraram um ranking com dez medidas preventivas, que podem ajudar a evitar tragédias como a das chuvas de janeiro deste ano.
Medidas simples, como a tomada pelo prefeito de Areal, Laerte Calil, são um exemplo de como as autoridades devem agir de forma preventiva.
Mesmo sem instrumentos adequados e oficiais, durante a tempestade, Calil não pensou duas vezes e saiu com o carro de som da prefeitura para alertar a população.
Calil não evitou que 80 casas fossem destruídas e cerca de 300 pessoas ficassem desabrigadas, mas evitou a morte de algumas delas.
Veja dez medidas para diminuir os impactos das chuvas
1. Mapear todas as áreas de risco
- A primeira medida é monitorar continuamente as condições ambientais de regiões consideradas de risco.
Esta é a opinião de David Zee, professor do Instituto de Geociências da UERJ (Universidade do Estado do Rio de Janeiro). Cidades localizadas perto de encostas, morros ou que são cortadas por rios devem ter um mapa com as informações necessárias para se prevenir tragédias climáticas e, principalmente, minimizar problemas no caso de eventos de grandes proporções.
A cidade de Hong Kong, na China, já possui um mapa com áreas de risco e planos de remoção há 40 anos. O documento é tão detalhado que é utilizado pela ONU (Organização das Nações Unidas) como exemplo para prevenção de desastres hídricos.
2. Remover moradores de áreas de alto risco
A melhor solução para evitar tragédias em áreas de alto risco é a mais dura para as autoridades e moradores, afirma a maioria dos especialistas consultados pelo R7. Para poupar vidas e evitar que casas e outros imóveis sofram com deslizamentos de terra e com enchentes, as prefeituras devem remover moradores que construíram em áreas de risco.
Esta também é a opinião de Rodolfo Moreta, engenheiro civil e pesquisador do Instituto Geológico (órgão ligado à Secretaria do Meio Ambiente). Segundo ele, as autoridades podem tomar medidas paliativas que diminuam os riscos dos moradores, mas o ideal é poupar vidas, nem que seja necessário procedimentos extremos.
- Nas áreas que são consideradas de risco muito alto, a remoção tem de ser de forma imediata. Nas demais, podem ser feitos planos preventivos para se conviver com o risco e, quando for o caso, realizar obras que diminuam o grau de exposição ao desastre. No entanto, a melhor solução é a remoção.
3. Prevenir ocupação irregular do solo
Embora seja desrespeitado, o Código Florestal Brasileiro já impede que se construa em terrenos cuja inclinação seja superior a 45º ou em locais acima de 1.800 m. Segundo o biólogo Mário Moscatelli, se as autoridades cumprissem a lei que eles mesmos criaram, o número de vítimas fatais seria menor.
- Eu não acredito que estas tragédias ambientais humanas vão parar, por que não é da cultura dos administradores brasileiros manter este tipo de ação e a população exigir a qualidade dos serviços. Infelizmente tem lei que pega e tem lei que não pega.
4. Construções de acordo com a realidade da área
As regras para a construção de imóveis é definida por cada município brasileiro, por meio do plano diretor de cada cidade. No entanto, a maioria das cidades brasileiras não tem este documento. Nos municípios da região serrana não existe este tipo de coordenada habitacional.
De acordo com Rodolfo Moreta, onde já existe gente morando, é preciso se pensar na remoção. Já onde não há famílias, deve-se evitar a ocupação dessas áreas.
- Onde há terreno com processos de escorregamento, as pessoas vão estar em risco. O gestor municipal deve impedir a ocupação de áreas de alto risco, de alta declividade, pois certamente se viverá com risco de desenvolvimento de escorregamentos.
5. Implantar sistema de radares
O Brasil conta com radares, no entanto, os 20 existentes não são suficientes para atender a todo o território nacional. Os Estados Unidos possuem uma rede interligada com 155 (todos com o sistema Doppler), que mede a velocidade dos ventos, a direção e prevê com bastante exatidão a quantidade e a intensidade da chuva que cairá sobre uma região. O que existia na região serrana estava quebrado.
David Zee aponta que o custo com a instalação desse sistema evitaria gastos ainda maiores com o pós-desastre.
- É tudo uma questão de prevenção. A primeira medida é um plano de monitoramente continuado e sob vários cenários: de chuva, de seca, de calor, de vento... se os governos fixarem estações meteorológicas e radares monitorados remotamente vão ajudar a diminuir o número de mortes.
Dois dias antes da última enchente na Austrália, em dezembro de 2010, os moradores de Brisbane receberam telegramas do governo pedindo para que a população deixasse suas residências.
6. Fazer obras de contenção de encostas
As prefeituras alegam que realizar obras extensas para a contenção das encostas têm custos onerosos aos cofres das cidades. Realmente o custo é alto, de acordo com Rodolfo Moreta.
Estas obras podem ser feitas no elemento em risco (casas dos moradores, por exemplo), para diminuir a vulnerabilidade, como fazer um muro ou anteparo, ou atuar aonde vai se desenvolver o processo, por meio do retaludamento (processo que consiste na adequação de uma encosta de forma a se obter um perfil menos perigoso) ou drenagem subterrânea.
- Todas estas medidas são muito caras e nem sempre eficazes, dependendo da magnitude do evento. Os japoneses construíram muros grandes para contenção de tsunami e eles não foram suficientes para conter as enchentes.
7. Monitorar o índice pluviométrico dos rios
- Essa discussão das margens dos rios não está sendo feita de forma adequada. A aplicação da lei depende de muitos fatores. Infelizmente as autoridades só pensam no que precisa ser feito durante as tragédias.
O Código Florestal Brasileiro já impede que se construa ao longo de 30 m das margens dos rios, muito embora a realidade que se vê seja outra. No entanto, Mário Moscatelli diz que basta verificar a extensão da destruição nos bairros que ficavam no entorno das águas e nos vales da região serrana para ver que as medidas não são seguidas.
Muitas das regiões sofrem com enchentes por ação do próprio ser humano, que constrói moradias em áreas de alagamento natural dos cursos d´água. O especialista afirma que, se houvesse um monitoramente dos índices de pluviosidade, em muitos casos as medidas para remoção seriam mais eficazes.
8. Criar alertas por meio de sirenes
A capital fluminense investiu fortemente em um sistema de sirenes que avisa os moradores de áreas de risco da cidade sobre riscos de chuvas e deslizamentos. A medida foi tomada depois que a cidade parou com as enchentes ocorridas em abril de 2010, que também vitimou quase 250 pessoas.
As prefeituras de Nova Friburgo e Petrópolis se interessaram pela experiência carioca do uso de sirenes. Pelo sistema, as sirenes tocam quando a chuva atinge o nível de 40 milímetros por hora. Os moradores são alertados inicialmente sobre a possibilidade de chuva forte e, se necessário, são orientados a sair imediatamente.
O subsecretário de Defesa Civil de Nova Friburgo, coronel Roberto Robadey, afirmou que estuda a implantação do sistema nas 130 áreas de risco mapeadas no município.
9. Políticas habitacionais de longo prazo
“Sem política de habitação, as tragédias vão continuar acontecendo, afetando as pessoas e o meio ambiente”, reitera David Zee. Para ele, se fosse criado um mapa de vulnerabilidade ambiental na região serrana, as prefeituras poderiam trabalhar as informações de forma a criar conglomerados urbanos em áreas com pouco risco.
No entanto, ele critica a forma como as autoridades pensam, mesmo quando buscam medidas para criar políticas do gênero.
- Políticas habitacionais adequadas devem ser levantadas para prazos longos, dez a 20 anos, não para apenas um mandato, como acontece no Brasil.
10. Coordenar ações entre órgãos
Os especialistas são unânimes em dizer que as ações (antes ou pós tragédias) devem ser coordenadas entre vários órgãos, para aperfeiçoar a prevenção ou a ajuda aos moradores. Mas ainda há um luz no fim do túnel. Todos citaram como bom exemplo o Centro de Operações da cidade do Rio de Janeiro, mas apontam que sua criação só ocorreu porque a cidade viveu dias trágicos em abril de 2010.
Além disso, aponta Mário Moscatelli, eles aceleraram sua criação pela pressão após o anúncio da sede dos Jogos Olímpicos de 2016.
- Hoje nós temos o Centro de Operações, que Rio copiou do sistema utilizado nos Estados Unidos. É justamente isso que tem que ser feito, copiar os bons exemplos. O governo do Estado precisa ter uma estrutura semelhante ao que o município tem, uma espécie de gestora de situações limites. É só utilizar o que foi feito em escala estadual.
Fonte: Portal R7
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