domingo, 29 de agosto de 2010

Professor Roberto Marx: gestão na construção civil

Caio Lauer

O apoio do governo à aquisição da casa própria, a facilitação de crédito para a construção de imóveis, os eventos esportivos da Copa 2014 e Olimpíadas 2016, e toda a infraestrutura envolvida na construção de estradas, aeroportos, entre outras grandes obras, impulsionam cada vez mais o setor de Construção Civil.

Conversamos sobre esse assunto com o Professor e Doutor Roberto Marx, coordenador do curso de capacitação em Gestão de Empreendimentos e Operações na Construção Civil da Fundação Vanzolini e professor de graduação e pós-graduação da Escola Politécnica da USP. Ele explica porque se faz necessária uma preparação de profissionais na área de gestão, em meio à criação massificada de empregos por conta da demanda atual.

O Prof.Dr. Roberto Marx fala também sobre sua carreira e como ingressou na área da educação.

Boa leitura!

Professor, conte sobre a sua formação inicial.

Minha trajetória está totalmente ligada ao departamento de engenharia da produção da Poli-USP. Sou formado nessa área com mestrado e doutorado e defendi a livre docência sempre no curso e no programa de pós-graduação de engenharia da produção.

Me formei em 1980 e atuei no mercado em empresas como Mercedes Benz, banco Itaú, em uma fundação que presta consultoria a insituições públicas – a Fundap. Iniciei o mestrado junto com a atividade profissional e aos poucos, ao longo dos anos, fui cada vez mais em aproximando do setor educacional e, em 1987, ingressei como professor. Mesmo assim, em tempo parcial e com o exercício da profissão de engenheiro em paralelo, até que em 1990 comecei a me dedicar exclusivamente a faculdade.

Como entrou para a área de educação?

Comecei como professor da Poli em 1987. Mas como educador, não fiquei fechado na área. Por exemplo, junto com meus colegas de trabalho, desenvolvemos projetos e consultorias pela Fundação Vanzolini.

Tenho atividades desenvolvidas na USP, dando aulas para graduação e pós. Em atividades mais focadas no mercado da construção civil, os cursos são da Fundação Vanzolini e alguns em parceria com a Universidade de São Paulo – direcionados para pessoas que já estão em atividade.

Desde 2001, atuo como coordenador de cursos na área de pós-graduação “latu-sensu”, que é um curso voltado para profissionais se capacitarem e se especializarem.

Apesar de estar em alta, o setor de construção civil enfrenta escassez de mão de obra especializada?

A construção civil é um setor que, ao longo das últimas décadas, tevês muitos altos e baixos. É um segmento muito sensível à evolução da economia. Quando o momento é bom, a construção civil acelera rapidamente. Por outro lado, quando a economia esfria, o setor também tem uma brusca queda.

Como estamos vivendo, nos últimos quatro anos, um período de “vacas gordas”, com o país em uma crescente e o mercado de trabalho e os negócios na construção civil aquecendo bastante, há uma expectativa que este ciclo positivo será maior do que das outras vezes, no passado. Há todo um prognóstico que aponta a manutenção da progressão no setor de construção civil.

Em um passado recente, a construção civil estava em baixa. Isso ocasionou, no ponto de vista de engenheiros, um desinteresse muito grande e pouquíssimos profissionais se voltaram para a área. Não havia crédito para aquisição de casa própria, por exemplo, e diminuiu muito o número de formados nas faculdades. E muitos desses formandos, se encaminharam para outros ramos da engenharia.

Por esse aspecto, há uma carência muito grande de engenheiros porque isso tem a ver com esse passado recente. Fica complicado porque o mercado está muito forte e expandido, e mesmo que tivessem graduado mais pessoas na área, mesmo assim haveria carência.

Como preparar/capacitar esses profissionais em um mercado cada vez mais dinâmico e competitivo?

Em um primeiro momento, temos profissionais com falta de formação técnica. De outro lado, os cursos de engenharia civil sempre focaram fortemente no aspecto técnico e muito poucas disciplinas são ligadas à gestão, como as de obras, do negócio e da empresa. A construção civil existe, mas sempre dentro de um ambiente de negócios.

Muitas vezes, o engenheiro está em contato com a obra, coordena um processo de construção de um projeto, mas tem também que entender do negócio e fazer a conexão entre as necessidades da organização com as decisões técnicas. Essa ligação é algo que cursos da área normalmente não abordam. Mesmo na Poli, onde leciono, o foco também é esse. Claro que não dá para graduar-se com especialização em gestão, mas acredito que poderia, e há professores que gostariam, de enfatizar mais essa questão.

Aquilo que é interessante no ponto de vista de um projeto e da sua construção depende muito daquilo que é o negócio da empresa. As organizações focam diferentes tipos de mercado, produtos e necessidades. Apenas boa técnica não resolve algumas situações.

A construção civil já se encontra mais aquecida também por conta dos eventos esportivos futuros como a Copa de 2014 e Olimpíadas?

Esse é mais um ponto que alimenta esse mercado e os negócios. Um fator que está fazendo toda a diferença no país é a oferta de crédito para a construção. Hoje, é muito abundante, como nunca aconteceu. Isso faz uma diferença muito grande.

De outro lado, as grandes obras, como as desses eventos, com maior foco no Rio de Janeiro. Mas todo o país precisa evoluir na questão da infraestrutura. A Copa no Brasil terá vários jogos em diversas regiões e isso tudo necessita de tratamento e investimento que o país não aposta há mais de 20 anos: infraestrutura urbana.

E qual o papel do profissional de gestão, nesse cenário gigantesco?

Caso haja recursos e um bom projeto, ele terá que entender os requisitos técnicos daquela demanda e terá que conseguir alinhar essas necessidades com o negócio. Se faz necessário entender a capacidade técnica e necessidades do projeto, em relação a construção na prática, e toda uma preocupação com prazos, custos, qualidade e manutenção dos requisitos do projeto. Isso é o que, por excelência, o gestor de engenharia ria se encarregar de fazer.

Muitos dizem que a Copa de 2014 será a “Copa verde”. Como desenvolver ações na construção civil com esse conceito sustentável?

O Brasil não é um país que tenha uma competência notável nesse segmento. Existem já alguns movimentos e essa preocupação na construção civil é algo forte, e tende a crescer cada vez mais.

Sou um pouco cético em relação ao quanto dessa oportunidade de apoiar ações sustentáveis nessas construções se tornará real. A necessidade é a de construir e viabilizar toda a infraestrutura, que atualmente é cheia de carências. Tenho dúvidas de, até que ponto, o país conseguirá alinhar esse déficit de estrutura, hotéis, estradas e aeroportos, com a preocupação ambiental. É algo desejável, mas creio as condições para tal são pequenas.

De que forma os profissionais da área terão que se adaptar na questão da sustentabilidade?

Isso, cada vez mais, tem que estar embutidos nos cursos de graduação. Está começando a acontecer, mas ainda é muito recente. Para fortalecer essas tendências em algo prático, é necessária uma legislação que incentive esse tipo de ação.

O setor de construção civil é diferente de outros porque tem um conjunto muito diversificado de tipos de negócio e matéria-prima. Se compararmos com a indústria automobilista, onde temos no máximo 10 grandes empresas, são elas que dão o ritmo e ditam o que vai acontecer naquele segmento. Na construção civil não existe essa tendência de um grupo fechado de empresas, há uma pulverização muito grande dessas influências. A legislação tem que ser feita, de uma certa forma, por meio de acordos entre esses vários grupos de fornecedores de matéria-prima, insumos, construtoras, juntamente com o governo. A preocupação com o “verde” depende desse tipo de relação.

As empresas têm valorizado mais o profissional de gestão?

As organizações são pegas de “calças curtas” nesses momentos de crescimento. Quando o mercado evolui, elas precisam contratar muito rapidamente para atender a demanda que cresce muito rápido e essa questão de gestão não é algo que, simplesmente por meio da contratação de profissionais, consegue atingir os objetivos. São sistemas de gestão que demanda tempo para serem projetados e incorporados.

Tem um aluno meu que está trabalhando em uma grande empresa de construção. É um engenheiro que atua na gestão de Recursos Humanos. Ele tem me falado muito que a empresa está contratando loucamente, mas é uma situação de confusão muito grande: são entrevistas atrás de entrevistas, e admissões desenfreadas.

E o profissional tem se atentado mais para essa faixa de atuação?

Creio que sim. O crescimento na carreira está intimamente ligado à capacitação e absorção de conhecimento de gestão.

Fonte: Jornal Carreira & Sucesso

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