terça-feira, 15 de fevereiro de 2011

Nova Friburgo renasce da poeira e começa a retomar rotina

Luís Bulcão Pinheiro

O barulho constante de sirenes, o trânsito caótico, as ruas bloqueadas, os caminhões militares, os helicópteros, os hospitais de campanha, todo o clima e aparato de guerra que dominou o cotidiano de Nova Friburgo, na região serrana do Rio de Janeiro, após as enchentes e deslizamentos que mataram 416 pessoas no município, arrefeceu. Se a poeira que levantou da lama ressecada que cobriu o centro da cidade nos dias da tragédia ainda paira em alguns pontos, ao menos uma característica típica a cidade serrana parece ter retomado, está novamente pacata.

A fachada da prefeitura não está mais tomada por veículos das Forças Armadas. O pátio também foi liberado das tendas do hospital de campanha da Marinha. O centro de gerenciamento de crise montado pela Defesa Civil foi desativado. Ainda lento em alguns pontos, o trânsito já flui. Não se leva mais uma hora e meia para percorrer uma distância que normalmente exegiria menos de 15 minutos.

As portas do comércio também voltaram a abrir. Conhecida como a "capital da roupa íntima" pelo grande número de confecções de lingeries, Nova Friburgo exibe ao longo de suas ruas outdoors de modelos vestidas apenas com calcinhas, sutiãs e camisolas. As lojas novamente expõem seus manequins nas ruas e os proprietários apostam na retomada.

A Praça do Suspiro, tradicional ponto turístico de Nova Friburgo, está novamente limpa. "O que salvou neste período foram nossas vendas de atacado para fora. Se dependêssemos só da venda da loja, teríamos que fechar. Mas acho que vai melhorar, as campanhas vão surtir efeito", afirma Josefina Paiva Coelho, proprietária da Men's Code. Fátima Vieira, dona da Sweet Woman, teve que atrasar a inauguração da sua loja. Durante o período de crise, ficou no Espírito Santo, onde tem casa. Só retornou três semanas após as tragédias. "Nova Friburgo tem potencial para se reerguer, mas vamos ter que trabalhar", afirma ela.

O casal Edna e Max Santos, proprietários da Belle de Jour, preferiram não recorrer às linhas de crédito de R$ 400 milhões oferecidas pelo BNDES colocadas à disposição dos pequenos empresários para amenizar as perdas com a tragédia. "Preferimos não contrair dívidas. Temos que avaliar o que vai acontecer, não podemos nos empolgar", afirma Max.

Voluntários continuam ajudando

A retomada não é tão automática para quem não teve apenas perdas materiais. Cláudio Pereira Coelho, 40 anos, luta para encontrar explicação ou motivo para seguir vivendo. Ainda abrigado em uma sala de um antigo laboratório de medicamentos, na comunidade da Prainha, localizada próxima à estrada que leva a Teresópolis, Cláudio retira de um saco plástico as fotos de Adriana, sua esposa, de Aleff, seu filho, e de Francieli, sua filha. Eles foram soterrados juntos quando o morro desceu sobre sua casa na madrugada do dia 12 de janeiro. "Eles foram morrendo. Primeiro a Francieli, depois a Adriana. O Aleff foi resgatado comigo, mas morreu no caminho. Esse menino vivia comigo, era muito grudado em mim", lembra.

O lamento de Cláudio se mistura com o barulho que entra pela janela. Uma trupe de palhaços do grupo Roda Gigante faz as crianças do abrigo brincarem e cantarem. O nutricionista Paulo Cesar Castro, 25 anos, conta que sobe a serra todos os finais de semana levando os palhaços que já trabalham com recreação em hospitais do Rio. "É para tentar trazer um pouco de alegria", justifica o jovem.

Logo adiante, na Ceasa de Nova Friburgo uma fila de cem metros se forma diante de uma mesa onde seis pessoas realizam o cadastro dos afetados pelas chuvas na região. No fundo do galpão, montanhas de alimentos, material de limpeza e roupas aguardam para serem distribuídos. O administrador da Ceasa, Luiz Cláudio Rosa, afirma que a procura por ajuda no mercado é grande por ele se localizar em uma região estratégica para a área rural de três municípios atingidos pelas chuvas, Nova Friburgo, Teresópolis e Sumidouro. Nos primeiros dias após a tragédia, o local foi usado pelas tropas do Batalhão de Operações Especiais da PM (Bope), que deu auxílio às vítimas e utilizou maquinário para liberar as vias da região. "Como o Bope teve que retornar, demos continuidade ao trabalho", afirma Cláudio. De acordo com ele, ainda são necessários alimentos para distribuição. "Seria excelente ter médicos e psicólogos voluntários aqui. Muita gente vem a procura de atendimento", solicita.

Ele formou uma equipe de 25 pessoas que sobe a serra todos os finais de semana, desde que as chuvas destruíram a região. O grupo também organiza viagens de jipe para locais de difícil acesso para levar mantimentos. "É incrível o que passamos aqui. O que motiva a gente é amor", afirma.

Fonte: Jornal do Brasil On Line

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